domingo, 29 de novembro de 2009

Lançamento de Livro: A Máquina da Memória


“O tempo presente entre a história e o jornalismo – A máquina da memória”, livro do professor de História da UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto), Mateus Henrique de Faria Pereira, será lançado dia 04 de dezembro, a partir das 18h30, na Quixote Livraria e Café. – Rua Fernandes Tourinho, 274, Bairro Funcionários.

O livro percorre a história do Almanaque Abril, o mais longevo e bem-sucedido produto editorial do gênero em circulação no Brasil Lançado em 1974 pela Editora Abril, o Almanaque é certamente mais bem sucedido empreendimento editorial do ramo, com recordes sucessivos de tiragem e boa aceitação junto ao seu público.

Como compreender e explicar o feito dessa obra que, em sua campanha publicitária de 1984, definiu-se como uma Máquina da Memória? O que era lembrado e o que era esquecido por esse livro-máquina? No livro o autor sugere como as mudanças editoriais do Almanaque podem ter interferido no modo de pensar de seus leitores. O Almanaque Abril é um almanaque? Como jornalistas e historiadores usam o passado, abusam dele e o representam? Os historiadores detêm o monopólio do passado? Por quais razões uma história dita factual, tradicional e cronológica é desejada e solicitada pelos leitores de textos históricos? A história no singular-coletivo ainda faz (e produz) sentido? Estas são algumas das respostas que Mateus Pereira procura encontrar com sua obra.

“A máquina da memória” narra com riqueza de detalhes as estratégias editorias adotadas pelo Grupo Abril. As pesquisas realizadas por Mateus Pereira abrangeram as edições de 1974 a 2006 e procuram mostrar, numa análise densa, mas de leitura estimulante o que o autor chama de “tempo presente” a partir da leitura das páginas do Almanaque Abril.

Mateus Pereira acredita que a obra despertará especial interesse entre profissionais de jornalismo e acadêmicos, em particular professores de História.


QUIXOTE LIVRARIA E CAFÉ

R. FERNANDES TOURINHO, 274, SAVASSI, BELO HORIZONTE

TEL: 32273077 - 32642858

sábado, 28 de novembro de 2009

terça-feira, 24 de novembro de 2009

"A Greve" de Adelino Magalhães

Adelino Magalhães nasceu no ano de 1887, no Rio de Janeiro. Geralmente, é enquadrado no âmbito do modernismo de viés espiritualista ou simbolista (enquadramentos assim são úteis, porém geralmente simplistas e, no pior dos casos, verdadeiras armadilhas). Sua obra abrange uma grande variedade de temas e linguagens: desde o “regionalismo”, passando pela questão social e urbana, até reflexões intimistas. Embora irregular, os melhores momentos de sua escrita são marcantes. Trago o autor para o blog, além disso, pelo fato de que os historiadores, quando trabalham com literatura, geralmente se prenderem a um círculo muito restrito de escritores e textos: Machado de Assis, Lima Barreto, Euclides da Cunha e Mário de Andrade.
De uma forma geral, toda consideração política do fenômeno literário é tida como reducionista – o que não se dá quando se trata de outras extrapolações para os campos da sexualidade, da ética, da epistemologia etc. No Brasil, porém, temos a tradição de alto nível representada por escritores como Dyonélio Machado e Graciliano Ramos, os quais questionaram a própria instituição literária pelas aproximações entre linguagem e poder. Os dois autores configuraram várias formas de silêncio e afasia como sintomas e, ao mesmo tempo, respostas contra a dominação.
O caso de Adelino Magalhães é diverso. O autor discutiu a questão social em inúmeros contos. O seu “A greve” foi publicado em 1918, um ano após a revolução russa, num momento de extrema efervescência sindical no Brasil. A história contada é simples: um pequeno movimento de revolta fracassa rapidamente, diante das pressões policiais e das negociações entre líderes operários e patrões. O mais interessante, no conto, é o discurso narrativo, que segue um ritmo alucinado, repleto de neologismos, de metáforas inventivas, palavrões, frases que se alongam de um jeito meio barroco. Tudo isso motivado pelo clima de ódio que anima a revolta. Mais que expressões racionais da luta de interesses, os operários seriam “almas ansiadas diante do surpreendente Destino!”
Por outro lado, os protagonistas são meio caricaturais, naquele esquema da elaboração dos personagens como tipos: o jornalista, o advogado, os burgueses. Estes, tratados como figuras sórdidas, calculistas. A polícia, como encarnação da brutalidade. Mas, nem por isso, os operários emergem como heróis épicos, redentores. Neles, o que se destaca é a incapacidade discursiva (em contraste com a linguagem exuberante do próprio texto). Incapacidade relacionada ao teor instintivo da revolta. Não exatamente sujeitos sociais determinados, os operários aparecem no conto como pura força vital: “O contramestre Henriquinho, o tal da sala maior dos teares, andou-se trepando na Ritoca do Augusto Gordo, houve o banzé da greve – ele saiu, ela e o pai saíram – e os dois pombinhos se foram ajuntar lá fora... o tal Henriquinho, safado, cara de alicate, que dizia que não governava cem teares, mas cem bocetas boas!”
E o advogado, por sua vez? “Falava com a rubra cara raspada, um pouco torta, para o ar, mostrando os dentes desmonotonamente brancos, amarelos, negros de cárie, douradinhos, numa expressão eclética de decisão, de medo, de deboche, de raposismo escolado e de boa vontade de natural!” Os contos de Adelino Magalhães procuram a forma do tumulto da vida no mundo contemporâneo. A raiva e o ressentimento seriam emoções fundantes, inclusive da própria escrita. Daí que as invenções do autor não fossem mero preciosismo, mas a procura de um discurso que incorporasse tamanha vitalidade e brutalidade. O trágico, porém, é que os possíveis heróis do conto são justamente aqueles com quem não haveria a possibilidade de comunicação. “A greve” deixa a revolta em estado de suspense. Há o operário, como figura ímpar da modernidade, em que se concentram as tramas do progresso e da exploração, mas não há a “consciência operária”. Em contraste, quando se fala em literatura proletária, nos vêm à mente romances de um insosso realismo propagandístico, na imagem do encontro entre o intelectual, o filósofo esclarecido e os agentes da virtude e da salvação da humanidade. O conto de Adelino Magalhães está mais para o belo poema de Drummond, “O operário no mar”, em que o tom é de admiração à distância, perplexidade e ambigüidade entre esperança e desilusão.

sábado, 21 de novembro de 2009

Depoimento: Diego Lopes da Silva - Mestrando na UnB em 2009.

Acredito que no meu caso a escolha por cursar História se deu por alguns fatores, dentre os quais: a importância de entender como se desencadeou os processos políticos, sociais e econômicos (isto e, de onde veio o que temos hoje), uma afinidade que sempre tive pelas humanidades, que na sua essência seria a "ciência da reflexão". E também porque desde a infância sempre amei temas ligados a história, e sempre tive um hábito de ler bastante, o que de certa forma me impulsionou ao estudo da história. Antiguidade sempre foi o meu forte, até porque amo a interdisciplinaridade e a Antiguidade proporciona um ótimo diálogo com a teologia e a antropologia.
Achei um curso bom, mas bastante superficial. Não sei se aquele velho lema de que quem faz a Universidade é o aluno, é válido.No caso do curso de história temos excelente professores em todos as áreas e disciplinas, entretanto, a constante busca pela ciência de formar profissionais especialistas, faz com que os generalistas sejam deixados de lado. Seria bom poder conviver no curso de história com ambiente estritamente de pesquisa de temas bastante pontuais e temas de amplitude maior. "Provavelmente nos dias de hoje, Marc Bloch e Braudel seriam alijados da academia".
Já sou Graduado. Sou Funcionário Público do TJDFT (algo que não tem nada a ver com minha formação) e aluno de mestrado do Programa Pós-Graduação em História da UnB. Pretendo continuar seguindo na carreira acadêmica, pois, na minha visão a realização profissional só é alcançada quando se atinge o seu "referencial" de vida, e o meu está ligado a Antiguidade Oriental.

Diego é também pesquisador do Projeto de Estudos Judaico-Helenísticos (PEJ)

Depoimento: José Oliver Lira, ex-aluno.

Olá, Meu nome é José Oliver.

Terminei a graduação no curso de História da UnB em 1996. Lecionei sete anos em escolas privadas de Brasília – o que não aconselho a ninguém. Agora, quero trabalhar no IPHAN, exercendo um ofício que eles consideram de historiador. O que me fez escolher História foi um motivo banal: a admiração inspirada por professores historiadores. Não fui observador meticuloso da dinâmica do curso de História da UnB. Na graduação, estudei no NEC – Núcleo de Estudos Clássicos do departamento de História. Afora críticas e eventuais folclores, não me detive numa avaliação sobre a experiência total da graduação.

Não farei ao gosto de Febvre. Prefiro falar de uma experiência pontual e, a partir desse lugar, dar minha impressão sobre o curso. O NEC foi um grupo animado pelos professores Emanuel Araújo, Sonia Lacerda e José Otávio Nogueira. As relações entre tradição e ruptura foram um dos temas pesquisados. Havia no grupo um forte interesse pela antiguidade grega, essa, inclusive, na modernidade. Esse interesse era motivado, a meu ver, sobretudo, pela competência desses professores. Debates, leituras, um forte sentimento de compromisso davam vivacidade ao grupo. Havia ali compromisso com um projeto acadêmico e intelectual. Não sei se havia outro grupo com esse espírito.

Não penso ter feito cursos interessantes de História do Brasil. Tampouco cursos de História da América. O modelo tradicional de blocos disciplinares como, por exemplo, História contemporânea I, II, etc. não me agradava.

O contrário dessa dinâmica foi os tópicos especiais em História Moderna organizados pela professora Tereza Kirschner. Tópicos especiais como Nossa herança, o Iluminismo foram valiosos. Gostava de teoria. Li textos do Foucault na aula de Eleonora Zicari.

É isso.
Um abraço.
José Oliver

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Sobre “Ligações Perigosas”, de Stephen Frears




Visto sob o ângulo da análise em si mesmo, o espectador mais desatento verá no filme Ligações Perigosas a competição entre dois ex-amantes num ambiente carregado de sensualidade na França do século XVIII. Aqui, no entanto, em vez de comentar o que obviamente salta aos nossos olhos, tentaremos ponderar aspectos que compõe o cenário social dos personagens. A obra cinematográfica é baseada no romance de Pierre Ambroise François Choderlos de Laclos, em publicado em 1782.
No plano político, fomos, desde o ensino médio, condicionados a enxergar o Estado Absolutista no Ocidente como mediador entre a nobreza feudal e a nova burguesia urbana. Essa hipótese foi desenvolvida por Engels e dominou a historiografia sobre Idade Moderna por muito tempo. Na década de setenta do século passado, Perry Anderson (historiador marxista) escreveu uma obra desestruturando tal proposição no livro “Linhagens do Estado Absolutista”. Ao contrário de Engels, ele considera as instituições do “Estado burguês” apenas superficialmente modernas (o termo moderno pode levar a outras discussões que, por hora, não cabem aqui). Pois, no período inicial da Idade Moderna, a classe dominante continuou a mesma da do final do Medievo: uma aristocracia feudal. Essa nobreza passou por profundas transformações, mas não foi desalojada da sua posição de comando do poder político. Logo, a coerção político-legal de caráter pessoal (suserano/vassalo) apenas deslocou-se em direção ao Estado centralizado.
A metamorfose dessa aristocracia feudal manifesta-se na primeira cena do filme. Nela, os personagens são vestidos, calçados, banhados, maquiados por um séquio de serviçais. Em todos os momentos da película, fica evidente a formalidade e o modo correto de proceder nas mais corriqueiras (corriqueiras para nós) situações do cotidiano. Na passagem dessa nobreza feudal para os palácios e o espaço urbano, Perry Anderson fala de um “amansamento” da nobreza feudal. [“No curso desse processo, a aristocracia do final do período feudal foi obrigada a abandonar antigas tradições e a adquirir muitas aptidões novas. Teve que deixar o exercício militar da violência privada, os padrões sociais da lealdade do vassalo, os hábitos econômicos de despreocupação hereditária, os direitos políticos de autonomia representativa e os atributos culturais de ignorância iletrada. Teve que aprender as novas ocupações de um oficial disciplinado, um funcionário letrado, um polido cortesão e um proprietário de terras mais ou menos prudente. A história do absolutismo ocidental é, em grande parte, a história da lenta reconversão da classe dominante fundiária à forma necessária de seu próprio poder político (...).” P.47]
Acerca do letramento: há uma constante troca de cartas entre as personagens e é pelo meio escrito que as intrigas se constroem. A Marquesa de Merteuil (Glenn Close) pede ao ex- amante, Visconde de Valmont (John Malkovich), uma carta como prova do sucesso em seduzir a piedosa Madame de Tourvel (Michelle Pfeiffer). Em outro momento, esta mesma personagem, Marquesa de Merteuil, atesta ter a adquirido a sua “natural” sagacidade através da leitura de vários filósofos. Ou seja, “as aristocracias ocidentais tinham começado a adquirir a educação universitária e a fluência cultural até então reservada aos clérigos” (p.48). Além disso, a jovem Cécile de Volanges (Uma Thurman) é recém-saída de um colégio para moças.
Outro aspecto desenvolvido pelo historiador marxista, e que também aparece no filme, é a questão do casamento. Mesmo com a instituição das embaixadas fixas, o casamento não perde a sua posição de instrumento da diplomacia. “O supremo estratagema da diplomacia era, assim, o casamento - espelho pacífico da guerra, que tantas vezes a provocou. Menos dispendiosa como acesso para a expansão territorial que a agressão armada, a manobra matrimonial proporcionava resultados imediatos menores (em geral apenas após uma geração) e estava sujeita, por conseguinte, aos acasos imprevisíveis da mortalidade, no intervalo entre a consumação de um pacto nupcial e a sua fruição política.” (p.39) Na trama das relações interpessoais inseridas no jogo político, o microcosmo dos personagens desse filme ilustra bem a consideração explicitada acima. Na intriga contra os laços do casamento, Visconde de Valmont tem uma dupla responsabilidade: desfazer a “felicidade matrimonial” de Madame de Tourvel (ela é reconhecida em seu meio social por isso) e impedir o consórcio de Cécile de Volanges ao Conde de Gercourt.
Não gostaria de deixar aqui, entretanto, a impressão de que Ligações Perigosas é apenas um "retrato" da sociedade de corte. Há uma crítica, bem mais evidente no livro que no filme, à "corrupção" moral, ao refinamento, à insensibilidade e ao egoísmo da aristocracia. Choderlos de Laclos demonstra assim, fazer parte da crítica de viés iluminista (em alguns momentos já com tons românticos) ao Antigo Regime.
Meu objetivo, portanto, ao conectar essas duas obras, é atrelar o micro ao macro nos processos históricos. Tentar enxergar no âmbito dos dramas individuais um complexo estrutural que, de certa forma, conduz os destinos pessoais.

Anderson, Perry. Linhagens do Estado Absolutista. São Paulo: Brasiliense, 2004.
[BCE: 321.61(4-15) A548Le 3. Ed]

Elias, Norbert. O Processo civilizador. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1994.
[BCE: 930.85 E42u =690]

Elias, Norbert. Sociedade de corte. Lisboa: Estampa 1987.
[BCE: 394.012(44)(09) E42h 2. ed. =690]

Villalta, Luiz Carlos. A sociedade como um teatro: Relações Perigosas.

Crítica do filme por Isabela Boscov em vídeo.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Documento

O termo tem sua origem no termo latino documentum, derivado de docere, “ensinar”. Passou a ter o significado de prova. A concepção do termo documento inicialmente se limita a textos “oficiais” escritos, que para a história positivista do século XIX, início do XX, será o fundamento do fato histórico. O documento então era o início do trabalho historiográfico, e sem dúvida a crítica documental era (e de certa forma ainda o é) o primeiro passo para uma história científica.

Há de se entender documento como tudo aquilo que, interrogado pelo historiador, cria algum tipo de conhecimento a respeito do passado. Textos escritos, dados numéricos, imagens, tradições orais, edificações, música, instituições... O documento não possuí um valor absoluto, em si, donde cabe ao historiador apenas retirar o que é dado. O seu valor se encontra sim na sua relação com uma série de outros documentos, e para além disso, o documento nunca é dado; de certa forma pode-se dizer que ele é construído, pelo questionamento feito pelo historiador. E mais ainda, a preservação e transmissão dos rastros/vestígios do passado (que se tornam ou não documentos), estão sempre sujeitos a uma destinação incerta e aleatória, fruto do interesse com que cada sociedade tem de preservar determinado indício do passado, bem como do caminho percorrido por ele até chegar ou não a nós.

Para o historiador, não importa tanto se o documento é verdadeiro ou falso (quer dizer, importa na medida em que sabe quando o é), porque de certa forma todo documento é ao mesmo tempo falso e verdadeiro. Falso na medida em que é parcial, é apenas um fragmento de um passado que em sua plenitude é infinitamente maior. Também por ser uma imagem, uma roupagem que as sociedades históricas fazem de si mesmas para as gerações futuras. E verdadeiro porque nos transmite uma representação, uma imagem desse passado. Mesmo documentos falsos, no sentido judiciário do termo (falsificações), podem ser úteis na medida em que, querendo ou não, podem nos informar à respeito do seu contexto em que foi produzido. Ou seja, há de se entender todo documento enquanto monumento, isto é, enquanto algo que nos faz recordar do passado, enquanto um sinal desse passado, que perpetuado voluntariamente ou não, há de ser decifrado pelas perguntas do historiador.

A crítica documental

Se antes, a historiografia transformava monumentos em documentos, ou seja, sinais do passado que permitem a perpetuação, em provas de fatos históricos; pode-se dizer que a historia atual tende a transformar o documento em monumento. Contudo, se ao longo do século XX o sentido de documento se transformou, essa transformação foi acompanhada de uma mudança também na forma como tratar os documentos.

De certa forma iniciada na Idade Média, consolidada no Renascimento, enunciada no século XVII por teóricos como Mabillon em seu De re diplomatica (1681), aperfeiçoada por avanços técnicos e pelos historiadores positivistas do século XIX, a critica documental se voltava essencialmente para a autenticidade e datação dos documentos. Na historiografia de hoje, pode-se dizer que, de certa forma, cabe ao historiador criar os fatos. O documento não possui um valor isolado, mas sim com relação a um conjunto maior de documentos, donde se tece uma relação, uma intriga, um confronto de documentos. Se antes, se acreditava que, primeiro, o historiador leria os documentos, depois verificaria sua autenticidade e veracidade, para depois os usar; se entende hoje que a leitura dos documentos já implica a idéia da pergunta. Os documentos só falam quando são questionados, perguntados a respeito de determinada hipótese ou problema.

O documento não é um dado qualquer que por acaso chegou até nós. É sim um produto da sociedade que o criou segundo as relações de forças que aí detinham o poder, e que cabe ao historiador tentar entender. O documento é composto por elementos culturais (entende-se aqui cultura num sentido amplo de linguagem) inconscientes, presentes nos discursos. Por meio de uma investigação, o historiador consegue, através desses símbolos inconscientes, criar uma imagem, digamos, representação, que tem por referente o passado.


Referências Bibliográficas:

DICIONÁRIO das ciências históricas. Rio de Janeiro: Imago, 1993. 773 p. (Na BCE: 93(03) D546c =690)

BLOCH, Marc Leopold Benjamin. Apologia da história, ou, O ofício de historiador. Rio de janeiro: J Zahar, c2002. 159 p. (Na BCE: 930 B651a =690)

LE GOFF, Jacques. História e memória. 5. ed. Campinas: UNICAMP, 2003. 541 p. (Na BCE: 930 L516s 5. ed. =690)

GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. 281 p. (Na BCE: 930.1:133.4 G493m =690 2. ed.)

VEYNE, Paul. Como se escreve a historia; foucault revoluciona a historia. 4. ed. Brasilia: Editora Universidade de Brasília, 1998. 285 p (Na BCE: 930.1 V595c =690 4. Ed.)

Ricoeur, Paul. A memória, a história, o esquecimento [2000]. Campinas: Editora Unicamp, 2007.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Revista Noctua e o Seminário dos estudantes de história

"A publicação tem como proposta, objetivo fundamental, a constituição de um espaço de debate e de reflexão acerca da produção textual de estudantes vinculados a cursos de graduação em História e áreas afins; mas tendo sempre como suporte principal o solo histórico. Nessa perspectiva, abrimos o convite a todos que desejarem ocupar este espaço. Sejam bem-vindos a um local em que se pensa a História plural, quanto às perspectivas teórico-metodológicas, e diversa no que diz respeito às temáticas e períodos abordados. Sejam bem-vindos a este projeto desenvolvido por alunos e alunas para alunos e alunas". retirado de: http://vsites.unb.br/ih/novo_portal/portal_his/periodicos_revistas.html

Para mais informações: http://vsites.unb.br/ih/novo_portal/portal_his/revista%20noctua/index.html

Na próxima sexta feira, dia 20 de novembro, estará sendo realizado no auditório
do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília, o I Seminário dos estudantes de história. A programação que me foi repassada é a seguinte:

9:00 – Abertura

Conferências e Debates – Auditório do IH:

10:00 – 12:00 - “História e Historiador na sociedade.”

Convidados: Prof. Estevão Rezende, Prof. Wolfgang Dopcke e Profª. Filomena Coelho

15:00 – 17:00 - “Como formar o Historiador?”

Convidados: Prof. Vicente Dobroruka, Profª Ione, Prof. Luiz Paulo Noguerol

19:00 – 21:00 - “Como ensinar História?”

Convidados: Profª. Diva Muniz, Prof. José Antônio Barbosa, Profª Susan, Prof. Daniel Faria (à confirmar)

Encerramento

Para além do debate proposto pelo seminário, acho que o evento é uma boa oportunidade para quem entrou agora, de estabelecer um primeiro contato com alguns dos professores do departamento, com os quais possivelmente terão aula.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Sobre Bastardos Inglórios, de Quentin Tarantino

Antes de comentar o filme (aliás, menos o filme em si mesmo do que sua relação com a história), dois exemplos comentados por Hannah Arendt em Eichmann em Jerusalém. Shalom Schwartzbard em maio de 1926 assassinou, em Paris, um ex-comandante cossaco, responsável direto pela morte de 100.000 pessoas num pogrom ocorrido durante as guerras civis russas. Tehlirian, um armênio, assassinou Tallat Bey no ano de 1921, em Berlim. Tallat Bey tinha sido o grande responsável por outro massacre, desta vez de grande parte da população armênia da Turquia. Ambos os assassinos se entregaram à justiça e transformaram o julgamento de seu crime numa oportunidade de discussão pública sobre os massacres.
Começo por aqui porque o tema do filme de Tarantino é a vingança. Nisso, Bastardos Inglórios se parece mais com uma fábula, bem ao estilo do diretor, do que uma reconstituição histórica. O próprio filme nos dá inúmeros sinais para deixar bem claro que nada daquilo aconteceu, ao menos da forma como a história é contada. Um grupo de judeus especializados na vingança sanguinária, justiçando nazistas e até mesmo decidindo a Segunda Guerra Mundial. Mas, há aí uma situação paradoxal: o cenário, as figuras históricas (pelo menos do lado dos nazistas), as suásticas, a ocupação da França, tudo isso nos envia um sinal inverso, de compromisso com a história. Acredito que isso explique a reação da platéia, ao menos na sala de cinema em que assisti ao filme. A cada nazista escalpelado, a sala era tomada por risos. Alguém me disse que poderia ser o tal do “riso nervoso”, mas sinceramente não acho que esse tipo de reação seja muito comum. Além do mais, não havia “risos nervosos” quando judeus morriam, apenas um silêncio respeitoso.
Se o filme de Tarantino não tem pretensões históricas, a platéia está mergulhada na história. A sensação prazerosa da vingança, do justiçamento, só faz sentido a partir da combinação de dois pressupostos: o mundo é claramente dividido entre mocinhos e bandidos e a violência cometida pelos mocinhos é benéfica e reativa, diferente da violência cometida pelos maus. Que este fosse exatamente um dos argumentos nazistas, isso inquieta. A filosofia da história nazista era baseada na idéia de que só existem no mundo duas categorias de pessoas: vencedores e dominadores contra fracassados e oprimidos. Por mais insano que seja, os nazistas não se cansavam de repetir que estavam se vingando dos judeus. No caso do filme de Tarantino, há uma injunção ao maniqueísmo que tem mais a ver com a forma narrativa das fábulas de vingança – embora algumas sejam menos esquemáticas, como o conto “A hora e a vez de Augusto Matraga” de Guimarães Rosa, por exemplo. Que muitos na saída do cinema tenham visto no filme a alegria da desforra, ainda que ressentida e fictícia, eis o que lança o filme em nossa historicidade. Talvez, isso tenha mais a ver com a vida urbana atual, em que “bandidos” (mas, também, moças de minissaia) são justiçados cotidianamente. Claro: estou comentando mais a reação do público do que o filme propriamente. Mas, por outro lado, Quentin Tarantino é um diretor que, inegavelmente, sabe conduzir o público, criar tensão, fazer rir ou assustar. Então, nada disso é acidental.
As duas histórias contadas por Hannah Arendt são completamente diferentes. Estão aqui, também, porque não têm nada a ver com a hipocrisia do pacifismo a todo custo, que no final das contas apenas dá mais armas aos justiceiros. Recordo, ainda, que outras alternativas foram aventadas, além da vingança. Contra o maniqueísmo, leiam-se os relatos de Primo Levi – em especial o capítulo “A zona cinzenta” em Os afogados e os sobreviventes. A primeira obra ficcional de Samuel Rawet (tem um pequeno texto meu sobre o assunto aqui) propõe outros caminhos, menos vinculados ao apego à identidade como forma de sobreviver e vencer, ao em nome de quê você faz isso ou aquilo. Quem quiser, ainda, assistir a um filme sem a menor condescendência com a violência, seja pela via da exaltação do herói, seja pela defesa dos direitos sagrados da vítima, assista a Saló, de Pasolini.
Sobre a questão da atualidade, o filme de Tarantino deu o seu recado, embora de maneira indireta. E acredito que essa é a sua maior virtude. Numa cena, Hitler pede a um soldado SS um chiclete, antes da apresentação do filme em homenagem ao herói nazista. O outro Hitler, o da história, era vegetarino, extremamente disciplinado quanto a questões alimentares. Além disso, tinha horror à chamada Indústria Cultural americana, como sabem aqueles que leram Maus de Spiegelman. Mastigando um chiclete no cinema, Hitler vira outra coisa, diversa do líder homicida: torna-se um banal espectador de cinema, muito parecido com todos nós e nossos baldes de pipoca. Mais ainda: o filme nazista é completamente “tarantinesco”, pelo que podemos captar das cenas vistas em segundo plano. E, para completar, Hitler chora de rir ao ver a brutalidade do filme realizado por Goebbels.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Depoimento:Thiago Dornelles Cardoso, 4º semestre em 2º/2009- História -UnB




Acho que a minha escolha pelo curso de história foi um tanto quanto inconsciente. Eu tava prestes a terminar o médio, e precisava escolher uma faculdade pra cursar. É uma necessidade que se impõe, sair do colégio e ir pra faculdade, pelo menos para o ambiente no qual eu estava inserido... Não imaginei nenhuma alternativa, como mudar de cidade ou arranjar um emprego... segui o rumo que seguiu boa parte das pessoas do meu convívio social, que era ir para faculdade.
Para escolher qual o curso, peguei um folheto com os cursos oferecidos pela UnB e fui riscando todos aqueles que não havia a menor possibilidade de eu gostar. Medicina, nutrição, agronomia e um bocado de outros saíram aí. Porém, a lista restante era bem grande ainda. De química à comunicação social, das engenharias à história. O primeiro vestibular que prestei, antes de terminar o colégio e só para conhecer o esquema sem pretensão alguma de passar, foi pra ciência da computação...
Por fim escolhi história, em detrimento de filosofia, para a qual também eu tinha passado (pelo PAS). Não porque fosse meu grande sonho trabalhar como professor (essa era minha perspectiva de trabalho) ou algo assim (eu já tinha abandonado meus sonhos de reforma da sociedade pelo magistério), mas porque eu gostava de história enquanto matéria e textos historiográficos divertiam a minha leitura.
O curso me parece bom. Salvo uma ou outra exceção, tive a sorte de encarar bons professores, tanto em sentido de capacitação (é, a UnB tem mecanismos pra garantir professores qualificados) quanto de consciência didático pedagógica (avaliações razoavelmente sãs, relação professor aluno, método didáticos...) e pode até parecer absurdo elogiar isso que poderia ser considerado pré-requisito... contudo, acredite, na UnB isso é uma grande coisa.
História na UnB é um curso bem flexível. Você pode se formar sem muito esforço, conseguir um diploma e rumar pra algum concurso da vida; bem como pode alavancar uma carreira acadêmica, há espaço pra isso, pouco, mas há. Essa questão do espaço pra formação de um acadêmico de verdade ser pouco se deve também pela pouca demanda. Grupos e projetos de estudo existem praqueles que buscam. Eles não se esforçam institucionalmente pra vincular os alunos, entretanto, se o aluno quer, corre atrás.
Problemas e faltas tem um monte e pode melhorar em um monte de coisa: na unb, no departamento, no ca, no currículo... Todavia vou deixar essa parte pra quem tenha um projeto específico pra defender. Com a abertura do licenciatura noturno e a reforma curricular, que ouvi dizer que dentro de alguns anos (!!) vai ser implementada, algumas incongruências vão ser atenuadas. Como a obrigatoriedade de monografia final pro bacharelado e coisas assim. Mas, o que pretendo fazer quando me formar? Não faço a mínima idéia.