segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Hyden White na França



A relação entre narrativa e história tornou-se um debate entre os filósofos e historiadores de língua inglesa a partir da metade da década de 1960 com a publicação simultânea de trabalhos de W. B. Gallie, Morton White e Arthur Danto. Eles enfatizaram o papel da narrativa no trabalho dos historiadores e foram muito criticados. O estudo da narrativa na literatura, evidentemente, já era desenvolvido há muito tempo e autores como Northrop Frye, Vladimir Propp, Roland Barthes e outros, produziram estudos significativos sobre a estrutura da narrativa. As duas linhas de estudo, a da filosofia e a da literatura, se desenvolviam paralelamente, sem grande influência recíproca até a publicação de Hayden White com o livro Metahistória: A imaginação histórica na Europa do século XIX em 1973, marco importante para o chamado “giro linguístico”.
White identifica três dimensões do labor historiográfico (epistemológica, estética e moral) e explica que, por ser uma estrutura verbal escrita em prosa, seu conteúdo é essencialmente poético (isto é, lingüístico). Ele distingue três estratégias de “impressão explicativa”: explicação por argumentação formal, explicação por elaboração de enredo e explicação por implicação ideológica. A combinação dessas estratégias constrói o estilo de escrita do historiador ou do filósofo da história e concretiza o ato que possibilita o uso de teorias específicas para explicar o passado. Para validar sua teoria, White examinou os estilos dos historiadores Michelet, Ranke, Tocqueville e Burckhardt e dos filósofos da história Hegel, Marx, Nietzsche e Croce.
Tendo esclarecido seus parâmetros de avaliação, o autor lança algumas “bombas”, heterodoxias que ele reitera ao longo de cada seção do texto. Para ele o trabalho do historiador é simultaneamente poético, protocientífico e filosófico e relembra que outros pensadores no século XX também questionaram a pretensão científica de ser da historia e o caráter fictício das reconstruções históricas. Logo, não há paradigma para avaliar se um relato é mais realista que outro. A melhor maneira de avaliar o relato histórico é pelos fundamentos estéticos (formais) e morais e não os epistemológicos.
Quanto à relação entre história e filosofia da história, a diferença está na ênfase e não quanto ao conteúdo uma vez que os filósofos da história exteriorizam o que permanece latente nos historiadores. Por conseguinte todo trabalho histórico tem uma base meta-histórica e esta constitui todas as filosofias da história que mantém todo o trabalho do historiador. Pela semelhança com os filósofos da linguagem, os filósofos da história foram os mais habilitados para compreender os fundamentos lingüísticos, porque qualquer pensamento não científico permanece preso ao mundo lingüístico para expressar-se.
As teses do “giro lingüístico” permaneceram pouco conhecidas na França entre os historiadores até o fim da década de 1980.
Porém desde 1967, Roland Barthes se questionou se a narração dos acontecimentos passados diferia da narração imaginária encontrada nos romances. Do mesmo modo, em 1968, Focoult propôs a análise da história como um discurso e, em 1971, Paul Veyne observou que a história era “um romance verdadeiro”, uma narrativa verídica. As proposições de De Certau (ele definiu a historiografia como “a combinação de um lugar social, de ‘práticas científicas’ e de uma escrita”) permaneceram isoladas na historiografia francesa.
Ou seja, todas essas análises não receberam muita atenção dos historiadores franceses da época. Maior repercursão ao giro lingüístico na França se iniciou na década de 1980, e proliferou para a de 90, a partir da publicação de Tempo e Narrativa de Paul Ricceur que aplicou o “método de White” na análise da obra dos Annales. Entretanto, até hoje Metahistória não foi traduzido para o francês!


 BIBLIOGRAFIA

CARR, David. Time, Narrative, and History. Bloomington: Indiana University Press, 1991.P.7-8.
DELACROIX, Christian; DOSSE, François & Garcia, Patrick. Correntes históricas na França: séculos XIX e XX. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2012. Pp. 324-326.
SUTERMEISTER, Paul. “A meta-história de Hayden White: uma crítica construtiva à ‘ciência’ histórica.” Revista Espaço Acadêmico, junho 2009 Nº 97, pp.43-48.
WHYTE, Hyden. “Prefácio” e “Introdução: A poética da História”, in: Metahistória: A imaginação histórica na Europa do século XIX. São Paulo: Edusp, 2008.

sábado, 27 de outubro de 2012

OAB/SP repudia declarações de historiador sobre a atuação de advogados


A OAB/SP divulgou nota pública repudiando declarações feitas pelo historiador Marco Antônio Villa, à TV Cultura, sobre a atuação de advogados. De acordo com o presidente em exercício da seccional paulista, Marcos da Costa, Villa teria insinuado "que há uma espécie de compadrio entre advogados e magistrados".
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"NOTA PÚBLICA
A OAB SP repudia, veementemente, as afirmativas do historiador Marco Antônio Villa sobre o papel exercido pelos advogados na defesa dos cidadãos. É inadmissível que um professor tenha uma visão tão distorcida sobre o direito de defesa e o contraditório. Na verdade, as referidas declarações prestam um desserviço ao Estado Democrático de Direito porque ignoram o papel do advogado no tripé da Justiça, insinuando que há uma espécie de compadrio entre advogados e magistrados e, pior, insinuando haver uma “sociedade indireta do advogado com o corrupto”.
O advogado exerce múnus público ao assegurar a todos os cidadãos o respeito aos seus direitos e garantias constitucionais, dentro do devido processo legal. As afirmativas desarrazoadas do historiador deixam subentender, até mesmo, que defende a negativa ao direito de defesa de acusados, direito este assegurado pela Constituição Federal a todos, sem exceção, independentemente do delito que lhes seja atribuído, por ser inerente aos regimes democráticos.
A visão do historiador confunde a figura do advogado com a de seus clientes. Sem dúvida, a corrupção provoca reações de inconformismo, mas sua imputação não pode excluir do acusado o seu direito à defesa.
Tais afirmações denotam, ainda, desconhecimento sobre a missão do advogado que é de pugnar pela defesa dos direitos de seus patrocinados e buscar um julgamento justo, a despeito das acusações que recaiam sobre os mesmos ou da dimensão do clamor público contra os atos que praticaram. O advogado sabe mais do que qualquer outro profissional os males que a intolerância pode acarretar.
Certamente, o professor Villa pode - assim como todos devem fazê-lo - criticar e discorrer sobre os prejuízos que a corrupção causa ao país; mas não pode colocar no mesmo patamar os advogados que instrumentalizam a defesa e os acusados desse gravíssimo delito. Durante a Revolução Francesa, os advogados foram banidos para agilizar os julgamentos e levar mais cabeças à guilhotina. No Brasil de hoje, não podemos cogitar sobre tal prática. Vivemos em um Estado Democrático de Direito, onde o exercício da advocacia é pleno e não poder ser vilipendiado.
São Paulo, 25 de outubro de 2012.
Marcos da Costa
Presidente em exercício da OAB SP"
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segunda-feira, 13 de agosto de 2012

sexta-feira, 1 de junho de 2012

As salsichas e a retórica: uma passagem do 18 Brumário

Numa conhecida passagem do 18 Brumário, Marx dizia que "nas lutas históricas deve-se distinguir as frases e as fantasias dos partidos de sua formação real e de seus interesses reais, o conceito que fazem de si do que são na realidade". Vejamos o que ele dizia sobre o papel revolucionário dos agentes do Estado, incluindo os que atuavam nas universidades: "Esse Poder Executivo, com sua imensa organização burocrática e militar, com sua engenhosa máquina do Estado, abrangendo amplas camadas com um exército de funcionários totalizando meio milhão,além de mais meio milhão de tropas regulares, esse tremendo corpo de parasitas que envolve como uma teia o corpo da sociedade francesa e sufoca todos os seus poros, surgiu ao tempo da monarquia absoluta, com o declínio do sistema feudal, que contribuiu para apressar. Os privilégios senhoriais dos senhores de terras e das cidades transformaram-se em outros tantos atributos do poder do Estado, os dignitários feudais em funcionários pagos e o variegado mapa dos poderes absolutos medievais em conflito entre si, no plano regular de um poder estatal cuja tarefa está dividida e centralizada como em uma fábrica. A primeira Revolução Francesa, em sua tarefa de quebrar todos os poderes independentes - locais, territoriais, urbanos e provinciais - a fim de estabelecer a unificação civil da nação, tinha forçosamente que desenvolver o que a monarquia absoluta começara: a centralização,mas ao mesmo tempo o âmbito, os atributos e os agentes do poder governamental. Napoleão aperfeiçoara essa máquina estatal. A monarquia legitimista e a monarquia de julho nada mais fizeram do que acrescentar maior divisão do trabalho, que crescia na mesma proporção em que a divisão do trabalho dentro da sociedade burguesa criava novos grupos de interesses e, por conseguinte,novo material para a administração do Estado. Todo interesse comum (gemeinsame) era imediatamente cortado da sociedade,contraposto a ela como um interesse superior, geral (allgemeins),retirado da atividade dos próprios membros da sociedade e transformado em objeto da atividade do governo, desde a ponte, o edifício da escola e a propriedade comunal de uma aldeia, até as estradas de ferro, a riqueza nacional e as UNIVERSIDADES da França.Finalmente, em sua luta contra a revolução, a república parlamentar viu-se forçada a consolidar, juntamente com as medidas repressivas, os recursos e a centralização do poder governamental.Todas as revoluções aperfeiçoaram essa máquina, ao invés de destroçá-la. Os partidos que disputavam o poder encaravam aposse dessa imensa estrutura do Estado como o principal espólio do vencedor. Mas sob a monarquia absoluta, durante a primeira Revolução, sob Napoleão, a burocracia era apenas o meio de preparar o domínio de classe da burguesia. Sob a Restauração, sob Luís Filipe, sob a república parlamentar, era o instrumento da classe dominante, por muito que lutasse por estabelecer seu próprio domínio. Unicamente sob o segundo Bonaparte o Estado parece tornar-se completamente autônomo. A máquina do Estado consolidou a tal ponto a sua posição em face da sociedade civil que lhe basta ter à frente o chefe da Sociedade de 10 de Dezembro, um aventureiro surgido de fora, glorificado por uma soldadesca embriagada,comprada com aguardente e salsichas e que deve ser constantemente recheada de salsichas. Daí o pusilânime desalento,o sentimento de terrível humilhação e degradação que oprime a França e lhe corta a respiração".

Uma teoria do significado

“Não sei o que quer dizer com ‘glória’”,disse Alice. Humpty Dumpty sorriu, desdenhoso.“Claro que não sabe… até que eu lhe diga. Quero dizer ‘é um belo e demolidor argumento para você!’” “Mas ‘glória’ não significa ‘um belo e de-molidor argumento’”, Alice objetou. “Quando eu uso uma palavra”, disse Humpty Dumpty num tom bastante desdenhoso, “ela significa exatamente o que quero que signifique: nem mais nem menos.” “A questão é”, disse Alice, “se pode fazer as palavras significarem tantas coisas diferentes.” “A questão”, disse Humpty Dumpty, “é saber quem manda — só isto.” Do famoso diálogo entre Alice e Humpty Dumpty. Em: Através do espelho e o que Alice encontrou por lá.

domingo, 13 de maio de 2012

Depoimento: Bill, 10º semestre em 1º/2012 - História, UnB

Fui uma criança gorda, criado pela avó, pais divorciados, ambos desiludidos com a vida. Enquanto um encontrou conforto na bebida, o outro se entregou ao trabalho para se livrar da angústia. Ah sim, meus caros. Nem todos os pais divorciados pagam pensão e amam os filhos. Meus pais me odiavam. Eu era a lembrança viva dos seus sonhos perdidos. Havia algo errado com esse mundo.

E eu queria compreender esse mundo.

Por que alguns pais levavam seus filhos à escola? Por que nas novelas, até os mais pobres tinham no café da manhã, frutas, queijos, sucos e bolos? Perguntas aparentemente tolas assim, sufocavam-me, era uma tortura muito pior do que o bullyng que sofria por ser gordo num mundo de crianças magricelas de tanto jogar futebol.

Porque era uma tortura silenciosa, ruminante por ser solitária. Como resistir a uma tortura que não se sente? Que devora sua alma com pensamentos egoístas até deixar seu coração completamente  insensível a dor alheia? Fui uma criança perversa, fiz e desfiz coisas de que não me orgulho, mas que não me arrependo tampouco. Se fosse um contrito arrependido não teria chegado a História.

Não foi na escola que encontrei respostas. As escolas não falam dessas coisas terríveis que perturbam as mentes juvenis. Mas foi a escola que me deu a oportunidade de conhecer as pessoas que tinham alguns legos desse quebra-cabeça. Legos que não estavam com os professores. Desde então, tomo por axioma que as respostas não estão em instituições, mas nas pessoas. Descobri também que havia pessoas como eu, que tinham os mesmos anseios, as mesmas dúvidas, mas que faziam perguntas diferentes. Entendi que a resposta dependia da pergunta de uma maneira totalmente inédita para mim: Não existem respostas, somente perguntas. A grande questão não é fazer a pergunta correta, é perguntar. As respostas estão aí, é preciso tropeçar nelas.

E eu tropecei na História.

Contradições. Feridas. Dor. Inquietações. A História nos livros didáticos, contava uma única e incontestável verdade. Já então eu tinha o pressuposto de que não havia uma verdade, mas perguntas a serem feitas.

Ah, e eu sempre gostei de ler também.

terça-feira, 13 de março de 2012

Uma ótima discussão

Historiadores pra quê?http://www.blogger.com/img/blank.gif

À luz do debate que sacode o campo de história estadunidense sobre a funhttp://www.blogger.com/img/blank.gifção social dos historiadores, Keila Grinberg contrapõe, em sua coluna de março, as expectativas do graduando em história no Brasil e a realidade que ele encontra depois de formado. A reflexão sugere um novo direcionamento profissional nos cursos de pós-graduação na área.

Por: Keila Grinberg

e o texto que serviu de ponto de partida - detalhe o Anthony Grafton é, sem dúvida, um dos melhores historiadores da atualidade. Vale a pena conhecer seus livros!

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

"Cientistas boicotam a maior editora de periódicos do mundo "

Olá pessoal,

A Folha de São Paulo veiculou essa notícia e, como estudantes, também temos grande interesse no livre acesso aos periódicos. Durante a minha experiência na Iniciação Científica, mesmo com o acesso a base de dados da Capes através da UnB, tive que comprar alguns artigos. Nesse momento eu pensei nos estudantes que não têm cartão de crédito internacional, por exemplo, para ter acesso a publicações quando elas são indispensáveis ao tema pesquisado.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

ANPUH diz: "O STF não sabe o que é história"

"O Ministro Cezar Peluso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), promulgou, em 29 de novembro de 2011, a Resolução No 474 que "estabelece critérios para atribuição de relevância e de valor histórico aos processos e demais documentos do Supremo Tribunal Federal". O documento causa perplexidade aos historiadores e a todos aqueles que, minimamente, tem acompanhado o desenvolvimento da historiografia contemporânea, em especial por duas razões: por procurar estabelecer "por decreto" o que é ou não histórico e por apontar como subsídio para essa classificação critérios considerados ultrapassados há, pelo menos, um século. Por esse motivo, a Associação Nacional de História (ANPUH), entidade que congrega os profissionais de história atuantes no ensino, na pesquisa e nas entidades ligadas ao patrimônio histórico-cultural, não poderia deixar de trazer a público a sua inconformidade com a referida Resolução."

Fonte: http://www.anpuh.org